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Foto: Gabriel Ferreira/PMO |
Há cinco anos Osório e
Santo Antônio da Patrulha discutem na justiça se o esgoto osoriense vai poluir
ou não a lagoa dos Barros (foto). Patrulhenses querem um estudo ambiental, mas
osorienses defendem que não é necessário
Lorenço Oliveira
OSÓRIO –
Pelo menos 30 mil osorienses aguardam pelo início das operações do sistema de
esgotamento sanitário da cidade. A Companhia Riograndense de Saneamento
(Corsan) ainda não começou os serviços, pois aguarda a finalização do Estudo de
Impacto Ambiental (EIA) na lagoa dos Barros, exigido pela Fundação Estadual de
Proteção Ambiental (Fepam), para garantir que as águas não serão poluídas. A
Fepam, por sua vez, tenta atender a reivindicação do município de Santo Antônio
da Patrulha, que exige judicialmente a realização do estudo. Osório não
concorda e alega que a Fundação já tinha dado aval para a estação entrar em
operação, e se ampara numa decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que
garantia o início das atividades. Enquanto isso, 30 mil osorienses seguem sem
esgoto.
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Concluída há dois anos, a nova estação de tratamento de esgoto (ETE) de Osório, que deve beneficiar 80% da população, está paralisada por questões judiciais.
Foto: Juarez de Andrade Jr./Arquivo Corsan
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O Ministério Público osoriense vem há anos pedindo para que
uma nova estação de tratamento de efluentes (ETE) seja construída, ou que a
antiga ETE seja reativada. Com a captação de recursos do Programa de Aceleração
de Crescimento (PAC), Osório reuniu verba suficiente para um novo investimento,
no valor de R$ 27,5 milhões. Com isso, o MP arquivou o inquérito civil.
O projeto previa a construção de 34 quilômetros de
tubulação, um emissário de 12 quilômetros, cinco estações de bombeamento
(EBE) e uma estação de tratamento de efluentes (ETE), de acordo com a Corsan. A
obra, iniciada em 2009 e concluída em 2012, proporcionará cobertura de esgoto
para 80% da população, beneficiando os moradores dos bairros Parque da Lagoa,
Porto Lacustre, Primavera, Albatroz e parte do Centro.
A população atual de Osório, segundo estimativa do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), está em 43.586. A maioria das
residências, comércios e instituições utilizam fossa asséptica e sumidouro como
solução para o esgoto. Grande parte dos efluentes é canalizada para a lagoa do
Marcelino. Em 700 metros
da orla, há pelos menos 10 pontos de deságüe de esgoto (semi-tratado).
Apesar disso, o projeto do novo sistema prevê a lagoa dos
Barros como destino final do esgoto. Para o MP de Osório, não havia porque
realizar qualquer estudo ambiental, visto que a Fepam já tinha licenciado a
obra. O problema é que um dos municípios vizinhos não gostou da idéia e iniciou
uma briga judicial.
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Atual corpo receptor do esgoto de Osório fica no bairro Caiu do Céu: a lagoa do Marcelino.Foto: Lorenço Oliveira/Momento |
SAP X Osório: uma eterna rivalidade
Fundada em 1811, Santo Antônio da Patrulha é um dos quatro municípios
fundadores do Estado, junto com Porto Alegre, Rio Pardo e Rio Grande. Por
muitos anos, compreendeu uma grande área, tendo originado mais de 70 cidades a
partir de seu território. Entre elas, está Osório, emancipado em 1857, que
levou consigo uma boa faixa do Litoral Norte. Além dos limites terrestres,
Santo Antônio da Patrulha e Osório são separados pela lagoa dos Barros, que
pertence aos dois municípios.
Em 2009, o Ministério Público patrulhense entrou com uma
ação judicial para impedir a construção do sistema de saneamento em Osório. O órgão alegava
que o esgoto dos osorienses iria poluir a lagoa e que a população de Santo
Antônio da Patrulha seria prejudicada. O MP exigiu, então, a realização de um
Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e um respectivo Relatório de Impacto ao Meio
Ambiente (RIMA). Por meio de uma liminar, expedida pelo juiz de primeiro grau de
Santo Antônio da Patrulha, foi ordenado a interrupção total da obra.
Além do município de Osório, a Corsan e a Fepam também são
réus da ação. As três partes decidiram pedir a suspensão da liminar no Tribunal
de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), que revogou-a parcialmente, limitando
a construção da obras, porém sem o aval para operar o sistema. A decisão não
era o suficiente para Osório, que entrou com outro recurso, dessa vez no
Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em outubro de 2009, o ministro do STJ César
Asfor Rocha suspendeu integralmente a liminar. Santo Antônio da Patrulha reagiu
com recursos, mas não conseguiu reverter a sentença.
No início deste ano, no entanto, o Ministério Público e o
município de Santo Antônio da Patrulha, juntamente com a Fepam e a Corsan
firmaram um acordo para executar um Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o
Relatório de Impacto ao Meio Ambiente (RIMA), antes de iniciar o lançamento dos
efluentes na lagoa dos Barros. “Só que Osório nunca concordou com isso”, relata
a Procuradora-Geral do município de Osório, Janine Santos Zart, que ingressou
com um recurso no TJ-RS, que cassou a decisão que homologava o acordo entre as
partes. “Por que no processo de licenciamento, a Fepam disse que não precisaria
desse estudo, que o município poderia fazer o lançamento por questões
técnicas”. Para Zart, a decisão do STJ dá suporte legal para que a Corsan
inicie as operações do novo sistema.
Eis, então, que surge mais uma condicionante. “Esta obra de
esgoto [em Osório] está concluída há dois anos. Nós não conseguimos a licença
de operação, por causa dessas questões jurídicas, que é uma questão política
entre os dois municípios. Então, a Fepam, que foi pressionada, pois ela já
tinha dado a licença de instalação, o que fez? Voltou atrás e disse: ‘Não,
agora vocês tem que fazer um emissário para lançar lá no meio da lagoa, a 700
metros’”, explica o Superintendente Regional da Corsan no Litoral Norte
(Surlit), Osvaldo Paiva.
A companhia fez uma readequação no projeto, licitou e
construiu o emissário, concluído há cerca de três meses. Aos cofres da Corsan,
a nova tubulação custou R$ 3,3 milhões. Paiva não acredita na hipótese de que o esgoto dos
osorienses irá poluir a lagoa. “Os efluentes tratados sairão com 98% [de
pureza]. A água do DMAE [Departamento Municipal de Água e Esgoto de Porto
Alegre], que se bebe, é 87% tratada”, compara. Mesmo assim, por exigência da
Fepam, o Superintendente confirmou que o EIA/RIMA está sendo executado e deve
ser concluído no fim de dezembro. “Só estamos aguardando a finalização do
estudo para colocar o sistema em operação”, garantiu o gestor.
Contatada, a Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam)
não soube responder porque voltou atrás na questão referente a Osório e se
manifestou com a seguinte nota no dia 3 de dezembro:
“Entre todas as ações de revisão e saneamento dos
licenciamentos ambientais referentes ao Litoral Norte (referentes ao
esgotamento sanitário) que a FEPAM está realizando há um ano e
meio, existe especificamente uma Ação Judicial do Ministério Público em
relação a Osório e Santo Antônio da Patrulha. Nesta semana [semana passada]
a FEPAM foi intimada para conhecimento e posterior avaliação dos estudos
técnicos apresentados no processo e agora vai conhecer as conclusões. Em
paralelo, existe um projeto de regularização ambiental dos empreendimentos
naquela região”.
Pressão política
A Procuradora-Geral de Osório, Janine Santos Zart, entende
que a briga entre os dois municípios tem componentes políticos. “A comunidade
[de Santo Antônio da Patrulha] não aceitava [os efluentes na lagoa] e exigiu
que o executivo tomasse uma posição. Teve algumas audiências públicas. Na
época, nosso prefeito foi junto com a Corsan e a Secretária do Meio Ambiente e
não foram recebidos de uma forma muito amistosa”, expõe Zart.
Em
Santo Antônio da Patrulha não há rede de coleta de esgoto. A
maioria dos 41.784 patrulhenses (segundo o IBGE) utiliza o sistema de fossa e
sumidouro. A Ecoplan Engenharia, empresa que presta serviços para a Corsan,
estudou a topografia do município entre 2008 e 2009 para a elaboração de um
projeto de esgotamento sanitário.
Na época, o município não conseguiu captar recursos para a
obra. Os investimentos foram adquiridos somente em 2014, através do PAC, no
total de R$ 36,3 milhões. O projeto compreende a construção de uma estação de
tratamento de efluentes (ETE), uma estação elevatória, um emissário e 48,9 quilômetros
de rede coletora.
A obra será executada em duas etapas, sendo que a primeira
foi licitada em julho deste ano, por Regime Diferenciado de Contratação (RDC),
no valor de R$12,4 milhões. De acordo com a Corsan, a previsão de conclusão é
de 720 dias corridos a partir da data de ordem de início dos trabalhos. A
cobertura de esgoto deve aumentar de 0% para 12%. O futuro sistema de esgoto de
Santo Antônio da Patrulha será através de bacias de infiltração, sem o
lançamento de efluentes em lagoas.
Até o fechamento desta edição, a Procuradoria-Geral de Santo
Antônio da Patrulha não respondeu aos questionamentos sobre o processo entre os
dois municípios.
Na edição de terça,
saiba o que outros municípios do Litoral Norte estão fazendo para se readequar
a Lei de Saneamento Básico