Semiaberto de
Osório incentiva empresas a contratar trabalhadores oriundos do sistema
prisional, que ainda sofrem preconceitos. Empresário da indústria de argamassa
vê mais eficiência neste tipo de mão de obra
Indústria de argamassa em Osório
contrata apenados que recebem salário, insalubridade, transporte e alimentação,
além de diminuição na pena por dia trabalhado
Foto: Lorenço Oliveira/Momento
Lorenço Oliveira
OSÓRIO – Como alternativa
para reduzir a população carcerária da Penitenciária Modulada Estadual de Osório,
a coordenação do semiaberto procura empresas da região interessadas em
contratar mão de obra prisional. Este tem sido o principal objetivo dos agentes
da Superintendência de Serviços Penitenciários (Susepe) Dário Barbosa e Elton
Almeida que trabalham atualmente neste regime no município.
A situação do regime fechado é preocupante. Hoje, 1131 pessoas estão
confinadas num espaço projetado para 592. Mas a população carcerária atual do
regime semiaberto é 142 apenados, em uma estrutura com capacidade para 300. Apesar
de estar longe da lotação, Barbosa e Almeida tem se preocupado na
ressocialização dos detentos nesta modalidade. E o emprego tem sido a melhor forma de qualificar estas pessoas.
O regime semiaberto permite que os apenados trabalhem fora dos limites
da penitenciária. De acordo com a Lei de Execução Penal (LEP) e o Regulamento
da Previdência Social (Decreto Nº3.048/99), ao empregador cabe apenas o
pagamento de salário, alimentação e transporte, salvo em casos de contratação
com registro de Carteira de Trabalho. Além disso, a cada três dias trabalhados,
o preso diminui um dia na sua pena.
O regime semiaberto da Penitenciária
Modulada Estadual de Osório
Foto: Lorenço Oliveira/Momento
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Apesar dos incentivos, ainda existe preconceito com a mão de obra
carcerária. Apenas 30 detentos do semiaberto em Osório trabalham. “Não existem
hoje ações do Estado em procurar as empresas interessadas em contratar esta mão
de obra”, afirma o agente Almeida. “Isso depende da vontade do preso e da
empresa”.
Os dois agentes assumiram a coordenação do regime em fevereiro do ano
passado. “No primeiro momento, o objetivo era cuidar apenas da execução penal.
Havia muita ociosidade e superlotação. Depois passamos a abrir aos empresários
e montamos um grupo para selecionar os apenados”, conta Barbosa.
Com duas assistentes sociais e um advogado, Barbosa e Almeida passaram a
correr atrás de documentação e outros benefícios aos detentos. “Nenhum dos
apenados que você vê aqui não tinham sequer identidade. E hoje eles têm até
conta bancária”, demonstra Almeida.
Para o apenado ser selecionado, ele precisa ter um bom histórico.
Durante visita do jornal Momento ao
regime semiaberto, dois detentos se aproximaram do repórter e do agente Dário Barbosa.
“Opa, será que vai ter um trampo aí?”, perguntou um deles. “Quando é que vai
surgir uma vaga para trabalhar? Não sou daqui [da região], seria bom...”,
questionou outro. “Estamos vendo alguns trâmites legais, amigo”, respondeu
Barbosa, que se orgulha de ver o interesse dos confinados ali.
Em setembro do ano passado, o empresário Jorge Nunes de Aguiar se
queixou para um amigo advogado sobre a dificuldade enfrentada para arranjar mão
de obra. “Foi então que ele me disse para procurar no sistema prisional”, relata
o dono da LAC Secagem de Areia.
Situada nos limites da cidade, próxima ao Cemitério Nossa Senhora da
Conceição em Osório, a empresa começou a empregar mão de obra carcerária em
dezembro de 2014. “Começamos com apenas dois apenados e hoje são 17. Todos eles
trabalham na parte de mistura de cimento e utilizam máscaras e óculos de
proteção. A perspectiva é de abrir mais quatro vagas”, conta Aguiar, que vê
mais vontade de trabalhar nos apenados do que nos demais.
Para Aguiar, não é o custo da mão de obra que motiva as contratações. “O
problema é que o pessoal aqui do município e da região geralmente pede as
contas em dezembro e vai pra praia”, argumenta o empresário. “Já o apenado não
falta serviço e tem sido bastante obediente”, garante Aguiar.
É o caso de um deles, que trabalha desde dezembro na LAC e pretende
continuar na empresa quando terminar sua pena. “O trabalho é pesado, mas é uma
chance que a gente tem para se erguer. Faltam quatro meses para acabar minha
pena. Se eu não estivesse trabalhando demoraria mais”, comenta o apenado, que
prefere não se identificar.
Segundo o empresário, os trabalhadores contratados por ele, oriundos do
sistema prisional, também recebem transporte e alimentação. “Eles recebem ainda
o piso da categoria mais 20% de insalubridade (totalizando R$ 1084)”, explica
Aguiar, que planeja ter 90% do total de seus empregados oriundos do sistema
prisional.
Os agentes da Susepe, Barbosa e Almeida, destacam que a LAC foi a
primeira empresa a procurá-los para firmar uma parceria. “É um caso pioneiro
aqui na região. Hoje estamos também com a Gessos Kramer, que está empregando
dois apenados”, informa Almeida, que já tem perspectivas de novas vagas e mais
empresas querendo entrar na parceria.
*Matéria publicada na capa do
jornal Momento do dia 27 de março de 2015.