sexta-feira, 27 de março de 2015

Empresa de secagem de areia em Osório prefere mão de obra carcerária

Semiaberto de Osório incentiva empresas a contratar trabalhadores oriundos do sistema prisional, que ainda sofrem preconceitos. Empresário da indústria de argamassa vê mais eficiência neste tipo de mão de obra 
Indústria de argamassa em Osório contrata apenados que recebem salário, insalubridade, transporte e alimentação, além de diminuição na pena por dia trabalhado
Foto: Lorenço Oliveira/Momento

Lorenço Oliveira

OSÓRIO – Como alternativa para reduzir a população carcerária da Penitenciária Modulada Estadual de Osório, a coordenação do semiaberto procura empresas da região interessadas em contratar mão de obra prisional. Este tem sido o principal objetivo dos agentes da Superintendência de Serviços Penitenciários (Susepe) Dário Barbosa e Elton Almeida que trabalham atualmente neste regime no município.

A situação do regime fechado é preocupante. Hoje, 1131 pessoas estão confinadas num espaço projetado para 592. Mas a população carcerária atual do regime semiaberto é 142 apenados, em uma estrutura com capacidade para 300. Apesar de estar longe da lotação, Barbosa e Almeida tem se preocupado na ressocialização dos detentos nesta modalidade. E o emprego tem sido a melhor forma de qualificar estas pessoas.

O regime semiaberto permite que os apenados trabalhem fora dos limites da penitenciária. De acordo com a Lei de Execução Penal (LEP) e o Regulamento da Previdência Social (Decreto Nº3.048/99), ao empregador cabe apenas o pagamento de salário, alimentação e transporte, salvo em casos de contratação com registro de Carteira de Trabalho. Além disso, a cada três dias trabalhados, o preso diminui um dia na sua pena.

O regime semiaberto da Penitenciária Modulada Estadual de Osório
Foto: Lorenço Oliveira/Momento

Apesar dos incentivos, ainda existe preconceito com a mão de obra carcerária. Apenas 30 detentos do semiaberto em Osório trabalham. “Não existem hoje ações do Estado em procurar as empresas interessadas em contratar esta mão de obra”, afirma o agente Almeida. “Isso depende da vontade do preso e da empresa”.

Os dois agentes assumiram a coordenação do regime em fevereiro do ano passado. “No primeiro momento, o objetivo era cuidar apenas da execução penal. Havia muita ociosidade e superlotação. Depois passamos a abrir aos empresários e montamos um grupo para selecionar os apenados”, conta Barbosa.

Com duas assistentes sociais e um advogado, Barbosa e Almeida passaram a correr atrás de documentação e outros benefícios aos detentos. “Nenhum dos apenados que você vê aqui não tinham sequer identidade. E hoje eles têm até conta bancária”, demonstra Almeida.

Para o apenado ser selecionado, ele precisa ter um bom histórico. Durante visita do jornal Momento ao regime semiaberto, dois detentos se aproximaram do repórter e do agente Dário Barbosa. “Opa, será que vai ter um trampo aí?”, perguntou um deles. “Quando é que vai surgir uma vaga para trabalhar? Não sou daqui [da região], seria bom...”, questionou outro. “Estamos vendo alguns trâmites legais, amigo”, respondeu Barbosa, que se orgulha de ver o interesse dos confinados ali.

Em setembro do ano passado, o empresário Jorge Nunes de Aguiar se queixou para um amigo advogado sobre a dificuldade enfrentada para arranjar mão de obra. “Foi então que ele me disse para procurar no sistema prisional”, relata o dono da LAC Secagem de Areia.

Situada nos limites da cidade, próxima ao Cemitério Nossa Senhora da Conceição em Osório, a empresa começou a empregar mão de obra carcerária em dezembro de 2014. “Começamos com apenas dois apenados e hoje são 17. Todos eles trabalham na parte de mistura de cimento e utilizam máscaras e óculos de proteção. A perspectiva é de abrir mais quatro vagas”, conta Aguiar, que vê mais vontade de trabalhar nos apenados do que nos demais.

Para Aguiar, não é o custo da mão de obra que motiva as contratações. “O problema é que o pessoal aqui do município e da região geralmente pede as contas em dezembro e vai pra praia”, argumenta o empresário. “Já o apenado não falta serviço e tem sido bastante obediente”, garante Aguiar.

É o caso de um deles, que trabalha desde dezembro na LAC e pretende continuar na empresa quando terminar sua pena. “O trabalho é pesado, mas é uma chance que a gente tem para se erguer. Faltam quatro meses para acabar minha pena. Se eu não estivesse trabalhando demoraria mais”, comenta o apenado, que prefere não se identificar.

Segundo o empresário, os trabalhadores contratados por ele, oriundos do sistema prisional, também recebem transporte e alimentação. “Eles recebem ainda o piso da categoria mais 20% de insalubridade (totalizando R$ 1084)”, explica Aguiar, que planeja ter 90% do total de seus empregados oriundos do sistema prisional.

Os agentes da Susepe, Barbosa e Almeida, destacam que a LAC foi a primeira empresa a procurá-los para firmar uma parceria. “É um caso pioneiro aqui na região. Hoje estamos também com a Gessos Kramer, que está empregando dois apenados”, informa Almeida, que já tem perspectivas de novas vagas e mais empresas querendo entrar na parceria.

*Matéria publicada na capa do jornal Momento do dia 27 de março de 2015.

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