quinta-feira, 2 de abril de 2015

Redução da maioridade penal volta ao debate





Carta do Editor | Lorenço Oliveira

Engavetada por cerca de 20 anos, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 171/1993 foi admitida no último dia de março (31) pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados. A decisão dos parlamentares reacende uma das questões mais polêmicas sobre duas mazelas do país: segurança e educação. A matéria, que altera o artigo 228 da Constituição Federal, reduz a imputabilidade penal de 18 para 16 anos.

O principal argumento para diminuir a maioridade penal é o clamor da população. Pesquisas do IBOPE, Datafolha e CNT/MDA apontam que 83 a 93% dos brasileiros aprovam que se coloquem adolescentes em prisões. Para esta maioria, prender jovens reduziria a impunidade e aumentaria a segurança.

Não parece lógico e prático que os parlamentares e o povo tenham se unido numa comunhão ideias depois de tanto desgaste? Uma relação podre que visa o ódio aos menores infratores. A proposta 171 é uma fabricação para cegar a verdadeira violência. De acordo com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), dos 21 milhões de adolescentes brasileiros, apenas 0,013% cometeu atos contra a vida.

O Brasil é o segundo país no mundo em número absoluto de homicídios de adolescentes, perdendo apenas para a Nigéria. Veja bem, 36,5% das causas de morte por fatores externos de jovens no Brasil são por homicídios. De acordo com a Anistia Internacional, sete pessoas de 15 a 29 anos são mortas a cada duas horas no país. São 82 por dia, 30 mil por ano. Destes, 77% são negros.

Por que achamos isso tão normal? Os dados que apresento aqui foram expostos pela jornalista gaúcha Eliane Brum, um dia antes da decisão da CCJ, em sua coluna no site El País. Faço questão de por um trecho de seu texto aqui:

Como é que vivemos enquanto eles morrem? Como é que dormimos com os gritos de suas mães? Possivelmente porque naturalizamos a sua morte, o que significa compreender o incompreensível, que dentro de nós acreditamos que o assassinato anual de milhares de jovens negros e pobres é normal. E, se essa é a realidade, a de que somos ainda piores do que os senhores de escravos, o que essa verdade faz de nós?

É uma falácia achar que diminuir a maioridade penal vai colocar nos trilhos a segurança do país. O que vai aumentar é a própria violência. E, nas palavras de Eliane, “a capacidade da sociedade brasileira de produzir crime disfarçado de legalidade”.

Faço uma analogia mais simples: quanto mais se duplica estradas, mais se engarrafa o transito; quanto mais se afrouxa o cinto, mais se aumenta a barriga. Quanto mais se aprisiona os jovens, mais violentos eles ficam.

A PEC 171/1993 é de autoria do ex-deputado do Distrito Federal Benedito Domingos (PP). Uma comissão especial será instituída para debater o mérito em até 40 sessões na próxima semana. Se aprovada, a proposta vai para duas votações no plenário e depois no Senado.

*Carta publicada na página 3 do jornal Momento do dia 3 de abril de 2015

Um comentário:

  1. Bravo!!! Tratar problemas complexos com "soluções" simplistas parece agradar uma boa parte da população brasileira. Infelizmente é a mesma parcela da população que aprova a volta pena de morte no Brasil sem se dar conta que a pena de morte aqui nunca deixou de existir. Um abração, Lorenço!

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